sexta-feira, 18 de julho de 2014

Esquerdismo e o momento político brasileiro


*Bruno Torres é fundador e
Comandante-Geral da Unidade Vermelha
Por Bruno Torres*

1. O movimento é marcado, internamente, pela luta contra os desvios de direita e ‘de esquerda’.

Toda a história de luta dos revolucionários no mundo é marcada, internamente, pela constante luta contra os desvios de direita e de esquerda dentro do movimento revolucionário.

Essa luta não é algo recente, e mesmo nos países que passaram por processos revolucionários (tomada de Poder), as lutas contra o oportunismo de direita e contra o oportunismo de esquerda ainda continuaram a ser travadas. Autênticos revolucionários devem admitir esses impasses e obstáculos por quais nós vamos passar – e sempre passaremos – para não ofuscar nossa trajetória política rumo à vitória de nosso povo. Aqueles que negam estas disputas no seio do movimento corroboram para que os lutadores sociais guinem ao pântano!

Para uma discussão frutífera, antes de tudo, é bom que não restem dúvidas em nada, nem na definição conceitual de “esquerdismo”. O que é então, esquerdismo? Esquerdismo, como nos disse Lênin, em parâmetros político-ideológicos, se trata da “esquerda da esquerda”, isso é, ter posições principistas ou extremas à esquerda, posições estreitas, e etc. por sua vez, o oportunismo de direita é justamente quando se abre mão dos princípios revolucionários se adaptando ao regime democrático-burguês.

A luta contra os oportunismos de direita e de esquerda no seio do movimento revolucionário se dá de muito tempo, e no movimento comunista vem de mais de um século, percorre todos esses anos e chega até a atualidade. As lutas travadas contra os “antiautoritários” na I Internacional é um exemplo de um embate contra os desvios esquerdistas. As lutas travadas contra Kautsky e seus seguidores, que degeneraram politicamente a II Internacional, é um exemplo de luta contra os desvios de direita. Além desses exemplos já citados, a Revolução Russa é outra experiência que merece ser citada. A Revolução Russa é um dos maiores exemplos da incansável luta contra tais desvios, tanto de direita, como esquerdistas, seja no decorrer do processo revolucionário, seja depois de Outubro de 1917 nos próximos anos do governo revolucionário. A história da Revolução Russa e da URSS também se caracteriza por ser uma história de constante luta entre linhas e “alas” no movimento (tanto fora como dentro do Partido Bolchevique). 

É importante estarmos sempre cientes de quais desvios estão em determinados momentos mais fortes e mais expressivos, bem como menos expressivos. Só assim, os revolucionários poderão avaliar em cada momento político quais desvios estão mais neutralizados ou não, quais problemas estão mais gritantes ou menos, e etc., dentro do partido e do movimento, e com isso quais problemas devem ter maior atenção e preocupação nossa em distintos momentos.

2. O momento político no Brasil

No Brasil, a situação política também requer mais do que nunca nossa reflexão sobre esse assunto.

Há alguns anos, com o declínio das gestões neoliberais do PSDB veio a esperança num governo popular e progressista encabeçado pelo PT. As classes mais oprimidas do Brasil se debruçaram em apoiar o PT na expectativa de que um governo encabeçado por tal partido resolveria os recorrentes problemas oriundos das contradições de classe – e das ingerências imperialistas – no nosso país.

A verdade é que, vastas camadas das classes menos abastadas, sobretudo da classe operária, e camponeses sem-terra que geralmente se organizam no MST, rumaram a apoiar esse “projeto” do PT, e nisso, boa parte dos partidos políticos de esquerda também se mostravam dispostos a apoiar o PT. O que obviamente de nenhuma forma é incompreensível.

Acontece que após três mandatos, a gestão do PT se demonstrou apenas ser uma forma mais “sutil” de Governo neoliberal, sem realizar importantes mudanças no quadro econômico do país. E hoje, podemos dizer que, a cada dia mais, as semelhanças entre PT e PSDB vem se tornando cada vez maiores. Nesse sentido, o PT, ao não avançar no acirramento da luta classes (pelo contrário, buscou conciliar os antagonismos de nossa nação) vem gerando um crescimento da apatia pela política nas massas que antes estavam mobilizadas.

Entre os partidos e coletivos de esquerda, isso também trouxe consequências. Um afastamento das agremiações de esquerda do PT, que aos poucos passou a não vê-lo mais como alternativa ao neoliberalismo (afinal, o PT estava sendo uma continuidade do neoliberalismo). Saídas em grande número de dentro da militância de base do próprio PT, criação de novos partidos, e etc. A questão é que o PT cada vez mais se “perde” em alianças com figuras como Sarney, Maluf e com partidos como PSC, PP, PMDB e etc. E cada vez mais outras agremiações se afastam, algumas mantendo desvios como o Reformismo, Eleitorarismo (o PSOL sendo o maior exemplo disso) e entre outros desvios. Mas o fato é que nem todas as agremiações que estão cada vez mais se distanciando do PT mantém tais vícios e desvios altamente nocivos a luta, e identificar os desvios de direita no seio do movimento revolucionário hoje (mesmo com a confusão político-ideológica que o PT trouxe há anos nos movimentos sociais) é mais fácil do que há anos atrás.

É preciso sempre lembrar de uma máxima muito recorrente no meio revolucionário, que diz que “A forma mais efetiva da classe operária perceber que a socialdemocracia não está por ela, é a classe operária perceber com a própria prática da socialdemocracia que ela está para a classe dominante, quando os reformistas encabeçam um regime burguês”. Historicamente, essa assertiva tem se demostrado correta, tomando como principal exemplo inclusive o processo revolucionário russo, onde os "moderados" puderam facilmente serem desmascarados quando, no governo, não foram capazes de levar adiante as medidas essenciais exigidas pelas massas cada vez mais radicalizadas.

Pois bem, a esquerda e a classe trabalhadora no Brasil tem percebido cada vez mais que o PT não está por eles. Desmascarar o oportunismo (de direita) depois de anos da gestão burguesa de um partido reformista que se dizia de esquerda, se tornou fácil, para nós revolucionários.

Nesse sentido, dentro do movimento revolucionário (e eu não falo aqui dentro da ““esquerda”” que abarque até os governistas) como resultado dessa situação política, os desvios direitistas no movimento estão mais neutralizados e mais perceptíveis, e logo, não apresentam tanto perigo como outrora apresentava, pelo contrário, entre nós, revolucionários, está cada vez mais “neutralizado”, mais fraco.

Neste sentido os desvios esquerdistas é que hoje estão menos perceptíveis, que estão mais ofuscados, e que precisam de nós mais atenção, justamente por conta desses fatores.

O militante revolucionário deve se policiar a todo o momento quanto a estes problemas recorrentes da militância. No Brasil, muito influenciado por estas questões já citadas, conjuntamente com o espírito das Jornadas de Junho, o esquerdismo em muito tem passado despercebido entre os militantes revolucionários, e dessa forma, caímos em vários erros práticos da militância, como o principismo, o “purismo”, sectarismo e entre outros, sendo todos eles variados sintomas de um mesmo mal: o esquerdismo.

3. Vigilantes contra o esquerdismo no seio do movimento

Adentro do movimento estudantil (e não apenas nele) vemos coletivos “horizontalistas” que centram suas críticas as outras agremiações de esquerda, na prática de “manobras no movimento”, na forma como agem nas entidades (“aparelhando”, por exemplo) e entre outras coisas. Boa parte dessas acusações acaba sendo ataques “a forma” de se agir no movimento, sem se centrar no “conteúdo” e na finalidade com qual está se agindo, sendo muitas vezes uma mera crítica “puritana” a condutas “aparelhistas”, “autoritárias”, e etc. E quase todas elas acabam sendo, além de serem críticas que não centrem fogo no conteúdo (mas sim na forma) das ações políticas, serem críticas vazias e hipócritas, pois no final das contas, as agremiações que mais atacam o autoritarismo desembocam em ser os grupos de indivíduos mais autoritários possíveis, e os que falam mais em “manobra” e “aparelhamento” são os que no final das contas mais “aparelham” as entidades. São os “puritanos” do movimento, que em certa medida também desembocam na hipocrisia política.

E também militantes que nos movimentos sociais em geral criticam qualquer manobra política e aliança com grupos que “sejam menos esquerda do que ele”, acreditando que é simplesmente rompendo com agremiações políticas que sejam oportunistas (ou que possuem desvios) que o “joio e o trigo” vão se separar, isso é, que demarcaremos campo entre nós e o campo não-revolucionário. Não, não é abdicando de toda e qualquer relação com grupos menos à esquerda que nós, que as coisas se resolveram assim. Na verdade, esse tipo de conduta só poderá, na verdade, contribuir para o isolamento dos revolucionários no seu trabalho político com as massas. Como nos diz Lênin:

“As pessoas ingênuas e totalmente inexperientes pensam que basta admitir os compromissos em geral para que desapareça completamente a linha divisória entre o oportunismo, contra o qual sustentamos e devemos sustentar uma luta intransigente, e o marxismo revolucionário ou comunismo. Mas essas pessoas, se ainda não sabem que todas as linhas divisórias na natureza o na sociedade são variáveis e até certo ponto convencionais, só podem ser ajudadas mediante o estudo prolongado, a educação, a ilustração e a experiência política e prática. [...] É surpreendente que, com semelhantes ideias, esses esquerdistas não condenem categoricamente o Bolchevismo! Não é possível que os esquerdistas [...] ignorem que toda a história do bolchevismo, antes e depois da Revolução de Outubro, está cheia de casos de manobra, de acordos e compromissos com outros partidos, inclusive os partidos burgueses!” (Wladimir Lênin).

Uma prática também recorrente dos esquerdistas é a sua falta de flexibilidade no que se refere aos métodos e espaços de luta com quais os revolucionários devem, respectivamente, implementar e ocupar.  Lênin já nos ensinou de muito tempo sobre a importância da combinação dos meios ilegais com os legais, inclusive, em certos momentos, até as eleições burguesas, sem ter nenhum ilusão quanto ao processo eleitoral burguês, obviamente. E há uma falta de flexibilidade por parte de muitos esquerdistas em verem estas questões por parâmetros principistas.

Da mesma forma que no discurso dos oportunistas de direita, a participação na eleição burguesa é o que há de mais importante na luta em nosso país, credulando a ela a possibilidade de mudança, e que se ausentar das eleições, é quase que uma heresia, do outro lado, para alguns indivíduos, a participação de alguma agremiação em determinados espaços institucionais já quer dizer que automaticamente essa agremiação é oportunista, antirrevolucionária, ou qualquer termo pejorativo do tipo, sobretudo se estivermos falando das eleições burguesas. É um principismo barato, tanto direitista quanto esquerdista: 1) “Não faz campanha nas eleições que realmente mudam o país? Sectário!”, 2) “Indicou voto num candidato? Oportunista!”.

Esse principismo, tanto em ver como um princípio a participação nas eleições, quanto em ver como um principio a total negação das eleições burguesas é extremamente problemático. Os revolucionários não devem ver como um princípio, tanto a participação quanto a não participação, mas sim, sempre como algo flexível a cada momento e situação política, por um ponto de vista tático e não de princípios!

Neste sentido é importante que nós, revolucionários, estejamos sempre vigilantes contra estes tipos de prática. Sempre que alguém falar muito contra o autoritarismo como justificativa de sua própria conduta autoritária e desrespeitosa para com o coletivo, nós revolucionários, devemos estar vigilantes. Sempre que determinadas agremiações com um discurso “horizontalista” e “puritano” contra os “aparelhistas” (geralmente agremiações ditas “autonomistas” e “libertárias”) estiverem justificando suas próprias práticas de aparelhamento, nós revolucionários, devemos estar vigilantes. Sempre que posições dogmáticas ou principistas estiverem crescentes adentro no movimento, nós revolucionários, devemos estar vigilantes.

Devemos estar vigilantes, e sempre precavidos para nunca estarmos sujeitos aos oportunismos tanto de esquerda como de direita no seio do movimento revolucionário. Temos sempre que estarmos vigilantes quando outros grupos políticos estão utilizando destas práticas, e sermos mais vigilantes ainda quando somos nós que estamos suscetíveis a pratica-las.

Denunciar o o esquerdismo no seio do movimento revolucionário e impedir que ele se propague entre nós é uma das principais tarefas dos revolucionários no momento político atual!

À Unidade!